BART 6221/74 - A HISTÓRIA DO BATALHÃO DE ARTILHARIA 6221/74 - ANGOLA 1975

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

PREÂMBULO – PARA UMA HISTÓRIA DE ANGOLA (PARTE 3) – AS VIAGENS DE DIOGO CÃO (1) – O DESCOBRIMENTO DE “ANGOLA” PELOS PORTUGUESES

Réplica do padrão de S.Jorge na Ponta do Padrão - Rio Zaire

PREÂMBULO – PARA UMA HISTÓRIA DE ANGOLA (PARTE 3)
 AS VIAGENS DE DIOGO CÃO (1)
O DESCOBRIMENTO DE “ANGOLA” PELOS PORTUGUESES

No título deste texto, escrevemos “Angola” – assim mesmo, entre aspas. Isto porque quando o navegador português Diogo Cão chegou ao território, Angola não existia. Nem sequer havia ainda o “senhorio” (Ngola Ndongo) que daria o nome actual ao país que agora conhecemos por essa designação.

Mas vamos por partes.

Evidentemente que, quando falamos em descobrimentos, estamos a adoptar o ponto de vista europeu: os europeus (portugueses neste caso) descobriram a “costa sul da África”, por exemplo. Mas o inverso não será falacioso, uma vez que os africanos também foram levados a “descobrir” os europeus – evidentemente por iniciativa dos primeiros... Contudo as coisas podem sempre ser colocadas sob os dois pontos de vista: se os europeus descobriram os africanos, estes foram levados a descobrir os europeus. Existe pois, um descobrimento reciproco, que terá sido eventualmente de perplexidade para ambas as partes: quem são estes tipos?

Como dissemos atrás, o navegador Diogo Cão foi enviado pelo rei D.João II (em 1482) a descobrir a costa ocidental africana. O problema é que não se conhecem nem as datas precisas das viagens nem quantas viagens este navegador realizou. Tudo isto devido à política secretista (confidencial, dir-se-ia actualmente) do rei, para ocultar os progressos da navegação portuguesa, dos vizinhos castelhano-aragoneses, italianos e mesmo franceses. Por causa dessa política não existem referências escritas ao que se passou neste reinado sobre essa matéria, senão por meia dúzia de apontamentos, em crónicas que nada têm a ver com essas viagens. E só por meio destes apontamentos cronísticos (ou mesmo outros) consegue entender-se alguma cronologia sobre o tema, ainda que não muito precisa. Digamos até que a própria viagem de Bartolomeu Dias na viragem do Cabo da Boa Esperança, só ficou a conhecer-se por um apontamento manuscrito de Cristovão Colón nas margens de um dos seus livros de leitura.

É de realçar que no estado actual das investigações, se presuma mesmo que, no final da primeira viagem do “descobrimento de Angola”, em 1483, Diogo Cão tivesse regressado ao reino, mas viajando para oeste propositadamente, descobrindo nessa rota a ilha da Ascensão e atingindo até o Cabo de S. Jorge na costa do Brasil !!! Este cabo, actual Cabo de Sto Agostinho, foi onde a armada de Pedro Álvares Cabral chegou quando “descobriu” o Brasil. E porque chegaria precisamente a este Cabo?

Isto tudo leva-nos a pensar muito a sério no porquê da insistência de D.João II na delimitação do meridiano “de Tordesilhas” a 380 léguas de Cabo Verde – nem 300 nem 400, mas exactamente 380. Porquê um número tão preciso?

O mestre de uma das naus de Cabral, aquando do “descobrimento” oficial do Brasil, conhecido por mestre João, refere ao rei D. Manuel que, quanto “ao sítio desta terra (o Brasil), mande Vossa Alteza trazer um mapa-múndi que tem Pêro Vaz Bizagudo de Lisboa, e por aí poderá ver Vossa Alteza o sítio desta terra; aquele mapa-múndi não certifica se esta terra é habitada, sendo um mapa antigo onde está escrita também a Mina.” Duarte Pacheco Pereira escreveria igualmente no seu Esmeraldo de Situ Orbis, dedicado a D. Manuel I, que em 1486 explorou a costa do Brasil...

Mas, perguntarão os meus amigos: o que tem o Brasil a ver com Angola? Tem! E muito. É que está estimado em cerca de 4.000.000 (sim 4 milhões), o número de escravos levados de Angola para o Brasil entre o século XVI e o XIX... Chega para relacionar as duas regiões?

Mas passemos então à Cronologia das Viagens de Diogo Cão na costa de Angola:

Em 1 de Janeiro de 1841, Diogo Cão (ou Caão) depois de viajar de S.Jorge da Mina pelo litoral do Golfo da Guiné, até ao Cabo de Sta. Catarina (actual Gabão), viaja a partir deste Cabo, de regresso a Portugal, mas em “volta de largo” pelo Golfo e descobre a ilha de Ano Bom (1 de Janeiro de 1481) a sudoeste da ilha do Príncipe.

Em nova viagem, Diogo Cão, saindo de Lisboa em 1482, provavelmente no mês de Agosto, e depois de reconhecer toda a costa desde o Cabo de Sta. Catarina, atinge o Rio Zaire (23 de Abril de 1483, dia de São Jorge) e implanta um Padrão de pedra, a que deu o nome de “S.Jorge”, na margem esquerda da foz desse rio – a que chamou Rio Poderoso –, que ficou conhecida como “Ponta do Padrão”. Foi o início do uso destes padrões em pedra calcária, para assinalar as terras a que chegavam os navegadores – anteriormente eram usadas cruzes de madeira.

Do Cabo de Sta. Catarina à foz do Rio Zaire...

Revelando que o rei D. João II já tinha informações sobre o que os navegadores poderiam encontrar no interior aficano, depois do Cabo de Sta. Catarina, Diogo Cão tinha instruções para enviar presentes ao “rei” de um potentado que existiria naquelas paragens, percebeu-se depois que seria o “reino” do Congo (ou mais correctamente Kôngo). Na verdade não se podem referir como “reis” os senhores destes “estados”, eles não tinham as prerrogativas que o termo – nas línguas e conceitos indoeuropeus – atribuem aos reis. Eram os chefes supremos de uma comunidade meio-feudal (no sentido arcaico do termo) de diversos outros chefes com menor poder. Mas foi assim que os portugueses os trataram sempre: “reis” e “reinos” os seus senhorios.

Segundo consta, Diogo Cão, em “conversa” com pescadores do rio, da qual não conseguimos descortinar como se entenderam (mas essa é a versão oficial) – para sermos claros nesta questão, não se consegue perceber como é que os portugueses chegaram à fala com pescadores kikongo, fazerem-se entender e conseguirem eles próprios entendê-los. Mas enfim... Conseguiu até contactar a “rainha” do Soyo (estado/senhorio da zona Sul da foz do Zaire, dependente do Kongo) e, de seguida enviou os tais presentes, por dois emissários ao “rei” do Kongo e largou para Sul, talvez no início de Julho de 1483. 

Foz do Rio Zaire

A "Ponta do Padrão"


Em 22 de Julho chegou à foz do rio Loge, a que chamou “Rio da Madalena”.

– 10 de Agosto, atingiu Benguela a Velha, actual Porto Amboim.

– A 28 de Agosto de 1483 atingiu o Cabo de Sta. Maria (actual Cabo do Lobo) onde mandou erguer o padrão de Stº. Agostinho, seguida de celebração de missa.

– Avançando mais quase 100 Km para Sul, a expedição terminou devido ao espesso nevoeiro, que não permitia a navegação de reconhecimento.


Padrão de Sto. Agostinho, na Sociedade Geográfica de Lisboa

Regressou à foz do Zaire, onde esperou encontrar os emissários enviados ao “rei” do Kongo. Não os encontrando, aprisionaram alguns nativos e iniciaram a viagem de regresso, em Novembro de 1483. Viagem para Portugal ou... para oeste até descobrir o Brasil?

Acrescentemos só que a chegada a Portugal se deu em Março/Abril de 1484.

NOTA: As fotos de satélite com os percursos desenhados e os mapas constantes neste post, foram colhidos do site:

A SEGUIR – A 2ª VIAGEM DE DIOGO CÃO

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4 comentários:

  1. Excelente trabalho de investigação e divulgação histórica.
    Abraço.
    GL

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  2. Fabuloso, amigo Machado Dias. Anseio a saída deste trabalho em Livro Papel. É um documento que faltava para esclarecer tantas dúvidas sobre essa epopeia maríitima e terrestre.
    Muitos parabéns e desejo que este trabalho saia à estampa o mais breve possível.
    Seu admirador e amigo
    José Ruy

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  3. Se vocês prestarem atenção na linha de tordedilhas, o litoral que fica em território espanhol - no Brasil - não se presta a nevegação, no Maranhão e litoral gaúcho.
    .
    Deveriam proibir chamar as viagens de "descobrimento" ou "achamento", mas de "confirmamento".

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