O “BATALHÃO PÉ DESCALÇO”
Descobri, numa comunicação do nosso camarada Eduardo Maia, a publicitar o Encontro anual do BART 6221/74 no próximo dia 17, em Pera Boa, que afinal o nosso Batalhão tinha Brasão e Guião, apesar de sempre me ter parecido que não tinha. Aqui fica.
Esta questão do “Batalhão Pé Descalço” tem-me partido a cabeça ao longo destes quase 40 anos. A minha ex-mulher, na altura escreveu-me a contar que havia saido na imprensa (penso que n’
O Jornal) uma notícia sobre o “Batalhão Pé Descalço” e logo aí fiquei furioso. Mas pensei que a peça poderia resultar de alguma “boca” de um dos nossos camaradas: “chegou tudo descalço” ou “chegou tudo em cuecas”, enfim... Tenho também pensado se o “descalço” não seria uma alusão ao “desarmado”... Mas depois do que me escreveu o tal meu amigo (cujo depoimento publiquei no post anterior) e de qualquer modo, já que estamos historicamente conectados com essa designação, vou deixando aqui as comunicações que se referem a ela. Mais tarde poderemos questionar ou reflectir nisto tudo, se é que alguém estará interessado em fazê-lo. Mas penso que tem alguma importância.
Deixo aqui um excerto do texto (uma Comunicação lida na célebre Assembleia de Tancos do MFA) publicado no blogue “Fora Nada e vão Três – Luís Graça & Camaradas da Guiné” – que podem ver
AQUI!
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Mensagem de José Belo (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, actualmente Cap Inf Ref), com data de 17 de Janeiro de 2010:
Caros Camaradas e Amigos.
Em comentário, quanto a mim, pertinente, Carlos Vinhal salienta o facto de poucas "histórias e Histórias" haver publicadas pelos que... fecharam a porta... das guerras de África.
Em complemento ao meu poste sobre a descolonização, e a propósito do referido, aqui segue a intervenção do delegado do M.F.A de Angola (Capitão Azevedo Martins) à Assembleia dos Delegados do Exército que ficou conhecida como a Assembleia de Tancos (2 de Setembro de 1975).
"(...) Estão presentemente sediados em Nova Lisboa um Comando de Agrupamento, um Batalhão de Cavalaria e um Batalhão de Infantaria. Não existe sequer uma arma pesada, e dos dois Batalhões, o de Cavalaria ainda poderá dispor de pouco mais de 100 homens para o combate, enquanto o de Infantaria não poderá dispor de NINGUÉM, pois é o Batalhão que veio do Luso e que os próprios soldados do Comando do Agrupamento e do Batalhão de Cavalaria apelidam do "Batalhão do pé descalço.
Este Batalhão, no seu deslocamento do Luso para Nova Lisboa, foi desarmado, e espancados alguns dos seus elementos, incluindo o próprio Comandante. Perderam-se cerca de 4000 armas, rádios, munições, material cripto, tudo em posse da Unita. Foi o próprio Chiwale, 2.º Comandante Militar da Unita, que ordenou esta acção contra o Batalhão, como represália por acções menos correctas das nossas tropas em Sá da Bandeira, das quais trataremos mais à frente. Deste Batalhão, soldados houve que chegaram a Nova Lisboa em cuecas, facto que terá traumatizado esses elementos, mas é agora trauma explorado para forçar a sua retirada imediata para Portugal, embora só tenha... 3 meses de comissão!
Ciganos, que fazem parte dos elementos do Batalhão, logo após a entrada no quartel que lhes foi distribuído, começaram com arrombamentos e roubos. Impossível é, e porque tudo já se tentou, convencer a maioria a pegar em armas, mesmo que seja para desempenhar a também nobre missão de sentinela. Os factos passados com este Batalhão, e com uma "espécie de Companhia" que apareceu em Nova Lisboa, muito contribuíram para uma quebra no entusiasmo com que os poucos mais de 100 homens do BCav vinham desempenhando árduas missões, mesmo fora da zona de acção, como foi a evacuação da população de Malange.
A "espécie rara de Companhia" que atrás referi é um bando, não digo armado, por à semelhanca do Batalhão, ter sido também desarmada pela Unita, quando do regresso de uma missão de Henrique de Carvalho para Luanda. O Comandante desta Companhia apareceu em Nova Lisboa escoltado por elementos da FNLA, brancos, armados, pedindo cerca de 2.000 mil rações de combate e alguns milhares de litros de gasolina. Refere-se que o dito Comandante da Companhia não estava sob qualquer coacção!
Peço aqui licença ao meu General para usar linguagem "vicentina"... mas estamos a averiguar casos de soldados que trocaram a sua ração de combate pela... "co.." de algumas desalojadas! É um tal Capitão França e Silva e a sua Companhia que recebe na ordem de dezenas largas de contos dos desalojados, aos quais já muito pouco resta na vida, e mesmo esta em risco de perder-se se nós não lhes valermos. São as acções deste mesmo Capitão ao entregar o quartel de Pereira de Eça em condições muito mais que cobardes como consta do auto de notícia, por mim escrito, em que fez entrar no Quartel elementos do MPLA e os dispôs em posições camufladas. Seguidamente foi comunicar à UNITA para ir receber o mesmo Quartel. O resultado não precisa de ser aqui descrito.
Mas não são só os Militares. É-o também um tal Encarregado do Governo que mesmo sabendo das carências dos refugiados se permitiu arrecadar seis ou sete toneladas de arroz, pois tinha no seu palácio albergados os Srs. Ministros da UNITA. Tive mesmo oportunidade de perguntar numa reunião, a este Encarregado do Governo, porque não estaria já hasteada no seu palácio a bandeira da UNITA, tal o estado, sujo e esfarrapado, em que lá tinha hasteada a bandeira Portuguesa! (...)”
À parte a inexactidão do “Batalhão de Infantaria”, da imbecilidade dos “ciganos” com “arrombamentos e roubos“ e outras “miudezas”, isto terá alguma coisa de real? Foi isto que se passou? Não me parece, não acredito nisto, mas aguardo outras opiniões...
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